Mar Português
Fernando Pessoa
Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quere passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.
Brasil... Sempre Brasil!
Sá de Freitas
Sempre foste, Brasil, livre e intocável...
No mundo o nome teu ressoa forte...
Na riqueza és gigante... E no teu porte
Fazes-te sempre imenso e inigualável.
E no teu solo, acolhes, com ternura,
Outros irmãos — de toda a humanidade —,
Pois és Pátria de amor e de igualdade,
E da PAZ hás de ser a mãe futura.
És nosso, sim, Brasil, e com certeza
Lutaremos com garra e com firmeza
Mantendo-te liberto e bem seguro.
Defenderemos tua honra e glória,
Tua flora, tua fauna, a tua História,
E o teu Presente... A bem do teu Futuro.
Samuel Freitas de Oliveira
Avaré-SP-Brasil
(Do E-book Luzes de Esperanças, AVBL)
Eu
Fernando Pessoa
Sou louco e tenho por memória
Uma longínqua e infiel lembrança
De qualquer dita transitória
Que sonhei ter quando criança.
Depois, malograda trajetória
Do meu destino sem esperança,
Perdi, na névoa da noite inglória,
O saber e o ousar da aliança.
Só guardo como um anel pobre
Que a todo herdeiro só faz rico
Um frio perdido que me cobre
Como um céu dossel de mendigo,
Na curva inútil em que fico
Da estrada certa que não sigo.
Meu Livro Íntimo
Sá de Freitas
Meu íntimo era um livro desfolhado,
Por torturas mentais e pelo pranto;
Pela saudade, pelo desencanto,
E pelas dores vindas do passado...
Por muito tempo assim abandonado,
Ficou na Estante do viver... Enquanto,
Bibliotecário eu, sentado a um canto,
Indiferente o via mutilado.
Mas resolvi reencardená-lo em cores,
Fui afastando dele os maus leitores,
Pondo-o na Estante d'autoconfiança.
À sua capa dei mais resistência,
Seu título mudei: pus "persistência",
E quem o prefaciou foi a esperança.
Samuel Freitas de Oliveira
Avaré-SP-Brasil
A Minha Vida É um Barco Abandonado
Fernando Pessoa
A minha vida é um barco abandonado
Infiel, no ermo porto, ao seu destino.
Por que não ergue ferro e segue o atino
De navegar, casado com o seu fado ?
Ah! falta quem o lance ao mar, e alado
Torne seu vulto em velas; peregrino
Frescor de afastamento, no divino
Amplexo da manhã, puro e salgado.
Morto corpo da ação sem vontade
Que o viva, vulto estéril de viver,
Boiando à tona inútil da saudade.
Os limos esverdeiam tua quilha,
O vento embala-te sem te mover,
E é para além do mar a ansiada Ilha.
Momentos da Vida
Sá de Freitas
Quando eu sorvo momento por momento
Na misteriosa taça da existência...
Se o gosto é bom, os bebo com frequência,
Se bom não for, os jogo ao esquecimento.
Uns são amargos como o sofrimento,
Outros, do amor, exalam doce essência,
Alguns até têm saibo de carência,
E muitos a fragrância de um alento.
Se tenho que sofrer... Não há saída...
Mas suportar eu posso se, na vida,
Meus passos forem cheios de confiança.
Pois vou poder assim, tenho certeza,
Com a fé matar de vez minha tristeza,
E fazer reviver minha esperança.
Samuel Freitas de Oliveira
Avaré-SP-Brasil
Em Busca da Beleza II
Fernando Pessoa
Nem defini-la, nem achá-la, a ela -
A Beleza. No mundo não existe.
Ai de quem coma alma inda mais triste
Nos seres transitórios quer colhê-la!
Acanhe-se a alma porque não conquiste
Mais que o banal de cada cousa bela,
Ou saiba que ao ardor de querer havê-la -
À Perfeição - só a desgraça assiste.
Só quem da vida bebeu todo o vinho,
Dum trago ou não, mas sendo até o fundo,
Sabe (mas sem remédio) o bom caminho;
Conhece o tédio extremo da desgraça
Que olha estupidamente o nauseabundo
Cristal inútil da vazia taça.
A Importância do Sonho
Sá de Freitas
Quando os sonhos se vão, muda-se a vida...
Mesmo que o corpo viva a mente é morta,
O ser vegeta e nada mais lhe importa,
Será qual ave a esvoaçar perdida.
Sem sonhos a esperança está vencida...
Sem esperança o ser nada suporta,
E a frente não encontra uma só porta,
Que possa lhe indicar qualquer saída.
Mas somente o sonhar de nada adianta,
Então eu digo: "Sonhador, levanta!
Luta! Realiza já teus ideais!"
E continua sonhando! Que a ciência
Da vida longa é a "não do sonho a ausência"...
Mas se não queres viver, não sonhes mais.
Samuel Freitas de Oliveira
Avaré-SP-Brasil
Há um Poeta em Mim que Deus me Disse...
Fernando Pessoa
Há um poeta em mim que Deus me disse...
A Primavera esquece nos barrancos
As grinaldas que trouxe dos arrancos
Da sua efêmera e espectral ledice...
Pelo prado orvalhado a meninice
Faz soar a alegria os seus tamancos...
Pobre de anseios teu ficar nos bancos
Olhando a hora como quem sorrisse...
Florir do dia a capitéis de Luz...
Violinos do silêncio enternecidos...
Tédio onde o só ter tédio nos seduz...
Minha alma beija o quadro que pintou...
Sento-me ao pé dos séculos perdidos
E cismo o seu perfil de inércia e vôo...
Ser Poeta
Sá de Freitas
Ser poeta é ser livre como o vento;
É se integrar à própria Natureza;
É captar — da vida — o encantamento;
É expressar — de si — toda a tristeza.
Ser poeta é sonhar intensamente,
Sem deixar de viver a realidade;
É descrever em versos, livremente,
A Paz do amor e a dor de uma saudade.
É — mentalmente— ir pelo Universo;
É tentar relatar em cada verso
Tudo o que sente e tudo o que vai vendo...
Ser poeta é sorrir — mesmo chorando;
É às vezes chorar — mesmo cantando;
É sentir-se feliz — mesmo sofrendo.
Samuel Freitas de Oliveira
Avaré-SP-Brasil
(Do E-book Raios de Otimismo, AVBL)
Eu Amo Tudo o que Foi
Fernando Pessoa
Eu amo tudo o que foi
Tudo o que já não é
A dor que já não me dói
A antiga e errônea fé
O ontem que a dor deixou
O que deixou alegria
Só porque foi, e voou
E hoje é já outro dia.
Néctar da Essência
Sá de Freitas
Morrer de amor por quê, se o amor é vida?
Sofrer no amor por quê, se o amor é paz ?
Chorar o amor por quê, se o amor é a ida
De toda a dor que a solidão nos traz?
O amor é o existir da existência,
É motivo que move quem respira,
É o néctar mais puro da essência,
Do tudo que no tudo se transpira.
Sá de Freitas, ler vc para mim sempre foi um aprendizado e um prazer sem fim, pq vc escreve meu querido com as veias pulsando e vai fundo na nossa emoção!
ResponderExcluirGrande Abraço,
Célia
Poetar é mágico, mas para poetar com Fernando Pessoa é preciso ser quase ou tão soberano quanto ele.
ResponderExcluirPoeta Sá de Freitas, rendo-me à força dos seus versos:
"Morto corpo da ação sem vontade
Que o viva, vulto estéril de viver,
Boiando à tona inútil da saudade. "
Parabéns!
Soraya Rangel