JOÃO ROBERTO GULLINO / 2º POETA CONVIDADO / MÊS

EXPRESSÃO MULHER

Procurei nos meus “arquivos implacáveis”, embora superficialmente, algum poema enaltecendo a mulher e achei somente dois sonetos – o meu e o satírico de Mário Rossi, antigo compositor já falecido mas que, apesar de ser muito espirituoso, não se coadunaria neste comentário. Além dos dois, duas brilhantes trovas, pois tudo que encontrei não enaltecia a mulher em si, mas o amor – portanto, de nada engrandece seu valor na forma física se não houver conteúdo em seu interior.

Por isto, sem elitismo, sempre digo que eu sou “eu” e não todo mundo, com minha visão de vida – certa ou errada – mas um pouco diferente dos demais. Assim sendo, enalteço meu respeito e admiração à figura da mulher, por seu valor, sua força, determinação e dedicação. E em conseqüência, angario grandes amizades femininas, conquistadas ao longo da vida, talvez, em função da minha maneira de ser. Ao contrário de muitos que só visam interesses outros, acredito mais nas autênticas e de conteúdo, que a mistura de sentimentos por oportunismos passageiros :

Que seja sólida e forte

a delicada amizade –

na vida ela dá suporte

mesmo em forte tempestade...

E tenho tido demonstrações patentes neste ponto, apesar da mulher, ao longo dos séculos, ter sido enaltecida em prosa e versos, mas não por ela em si mas pelas paixões inspiradas, colocadas num pedestal de musa para atingir a meta determinada, romanticamente. No meu entender, o valor da mulher, como ser humano, está muito acima de tal patamar além de um simples desejo, embora ser desejada será sempre uma saudável vaidade feminina – mas aí é outro assunto à parte, que não se encaixaria neste comentário pois a finalidade é a de sua valorização interior, como mulher, mesmo que, às vezes, seja difícil no seu equacionamento. Mas existem mulheres de excepcionais qualidades como vemos no cotidiano, à nossa volta, de uma sensibilidade absoluta, de uma dedicação total – e diante dessas sim, temos que nos reverenciar e colocá-las num pedestal por sua figura humana pois, de um modo geral, será sempre mais dedicada em relação ao homem, por diversas razões, inclusive, de ordem naturalmente genética. Por isto, no final de um soneto dedicado à minha mulher, ressalto :

... para agasalhar toda essa emoção,

uma palavra apenas de ternura,

momentos de eterna gratidão,

tantos anos repletos de venturas!

Mas o poeta e trovador Edmar Japiassú Maia, do Rio de Janeiro foi muito feliz e intuitivo quando assim se expressou :

Vem as rugas e no entanto

a mulher não se intimida –

a perda externa do encanto,

não desencanta uma vida.

E tais palavras podem ser interpretadas de diversas maneiras pois as rugas, na vida, não são somente as físicas – são  também conseqüências da luta para impor seu respeito, sua meta e a disposição às contendas enfrentadas, pacificamente, sem revolta, independente de sua moldura pois, para superá-las, foi  distinguida com a maternidade – a mais sublime missão sobre a Terra. E,quando olhamos para trás, para nossas próprias origens, nos envaidece, gratifica e sensibiliza a resignação demonstrada, apesar das batalhas enfrentadas, das lágrimas escondidas, das noites insones e, às vezes, das mãos calejadas, mas com a fé determinada de ter alcançado tudo com sua simplicidade, dedicação, disposição e carinho.

Dizem que Deus, ao criar a mulher, não retirou um pedaço do cérebro do homem para que ela não o superasse na sua inteligência, e nem tirou um pedaço dos pés para evitar que fosse  pisada, mas a fez de uma costela, a peça mais próxima do coração para poder ser amada e respeitada. Por isto, o antigo humorista e trovador, Jorge Murad, assim a definiu, com muita graça:

Não há, no mundo presente,

nenhuma coisa mais bela

que o que Deus onipotente

fez, de uma simples costela...

João Roberto Gullino

Petrópolis, RJ

Maio de 2012

Sexo Frágil

João Roberto Gullino

Ela tem tanto mistério e tanta graça

no seu encanto tem rara beleza,

não lhe falta vigor nem sutileza,

nem a delicadeza no que faça.

Sexo fraco é, mas bem que despedaça

e derruba a mais dura fortaleza,

com sua forte e doce natureza,

e a determinação como couraça.

É sempre, em cada vida, uma constante,

transformando em fração cada segundo

pela maneira meiga e insinuante.

É, na verdade, um ser mais que profundo

como quando mulher, mãe ou amante,

ajoelhado aos seus pés, rende-se o mundo.

Mulher de Cada Vida

“A mulher formosa agrada aos olhos, a bondosa ao coração. A primeira é uma jóia, a segunda, um tesouro.” - Napoleão Bonaparte

Falar genericamente sobre a mulher

seria até, um pouco de devaneio

misturado com fantasia, eu creio,

como a grande maioria prefere e quer.

Gostaria, sim, de falar de um exemplo melhor,

olhando, em verdade, ao meu redor.

Vejo minha mãe chegando aos noventa

com toda uma fibra de anos de luta,

sofrimento e uma dor muito absoluta,

que só a perseverança a sustenta.

E, se pelas lutas vitória não logrou,

pelo próximo, ao menos, sempre se desdobrou.

Vejo minha mulher e companheira,

sempre ao lado com a compreensão que abriga,

com a calma e paciência amiga,

com muita fé e confiança na algibeira.

E soube a vida enfrentar sem dela nada cobrar,

para aos seus poder bem se dedicar.

Vejo minhas três filhas, três temperamentos,

todos distintos, mas uníssonas na dedicação,

ao comportamento da vida encarar de antemão,

cientes ser ela um eterno desdobramento.

E cada uma, com seus diversos predicados,

só confortam, neste mundo tão conturbado.

Vejo, finalmente, minha pequenina neta

que, aos seis anos, transborda pelo caminho                         

o puro mel de tanta doçura e carinho,

duma pureza a inspirar qualquer poeta,

enfeitando a estrada que nos foi cedida,

como uma flor que é, desabrochando para a vida.

A todas, um respeito e uma gratidão,

cujas vidas podem ser enaltecidas,

cada uma em sua trajetória vivida,

da mais velha a que está quase no embrião,

como uma realidade de verdadeira mulher

e não como uma fantasia qualquer.

Dueto entre os poetas:

 Florbela Espanca e João Roberto Gullino

Frieza

Florbela Espanca

(do “Livro de Soror Saudade”)

Os teus olhos são frios como espadas,

e claros como os trágicos punhais;

tem brilhos cortantes de metais

e fulgores de lâminas geladas.

Vejo neles imagens retratadas

de abandonos cruéis e desleais,

fantásticos desejos irreais,

e todo o oiro e o sol das madrugadas !

Mas não te invejo. Amor, essa indiferença,

que viver neste mundo sem amar –

é pior que ser cego de nascença !

Tu invejas a dor que vive em mim!

E quanta vez dirás, a soluçar :

 “Ah! Quem me dera, Irmã, amar assim!...”

Dor Oculta

João Roberto Gullino

Um cético acredita que somente

um sonhador transforme sentimento

em versos de paixão, à sotavento,

amor enaltecido eternamente.

Saber reconhecê-lo inda que ausente,

mesmo flutuando até no firmamento,

a fagulha que nasce no momento

é o êxtase que surge de repente.

Mais sublime, é amar que ser amada,

uma dedicação de enlevo, eterna,

que a ternura  conserva assim - mais nada.

Se a dedicação é porção materna,

se seu grande carinho é de uma fada,

a dor, muda e escondida, nunca externa.